EFEITO VINCULANTE EM DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE CONFERIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DO ESTADO BRASILEIRO

Resumo

O presente trabalho aborda a possibilidade de efeito erga omnes em decisões postas em controle difuso de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil, considerando que, em que pese estabelecer-se, como regra, o efeito inter partes para decisões deste jaez, a Corte Suprema ao julgar improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3470/RJ), acabou por reconhecer, em sede de controle difuso, a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei Federal nº 9.055/95, e neste aspecto, empregou efeito vinculante e erga omnes à decisão transitada em julgado, ao invés de aplicar o artigo 52, X da Constituição da República, que estabelece como competência privativa do Senado Federal, suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. O presente estudo pretende estabelecer eventuais limites dos efeitos das futuras declarações incidentais de inconstitucionalidade de leis pela Suprema Corte Brasileira.

Introdução

Partindo do pressuposto de que o Controle de Constitucionalidade exercido pelas Cortes brasileiras segue modelo misto ou hibrido, com controle concentrado (abstrato) de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal e difuso (incidental), realizado por qualquer Juiz ou Tribunal, estabelece-se que, nas decisões tiradas em controle concentrado de constitucionalidade, o alcance é erga omnes, enquanto nas hipóteses de controle Difuso, os efeitos das decisões ficam restritos as partes integrantes do litígio.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3470/RJ, em que se pretendia a declaração de inconstitucionalidade da Lei Ordinária do Estado do Rio de Janeiro nº 3.579/2001, julgada IMPROCEDENTE, acabou por declarar, de forma incidental, a inconstitucionalidade do 2º da Lei federal nº 9.055/95 e ao invés de deixar a Cargo do Senado Federal a suspenção da execução da lei declarada inconstitucional, na forma do que preceitua o artigo 52, X da Constituição da República, empregou efeito vinculante e ERGA OMNES à declaração de inconstitucionalidade incidental.

Portanto, o objeto do presente artigo é avaliar em que contexto, partindo da análise do precedente jurídico inaugurado pelo julgamento da ADI 3470/RJ, as decisões proferidas em sede de controle difuso de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal terão alcance erga omnes.

O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL

Inicialmente importante destacar os principais modelos de controle de constitucionalidade existentes e neste aspecto, o controle difuso de constitucionalidade, de inspiração norte-americana foi introduzido primeiramente no país por Rui Barbosa na Constituição de 1891, em que se observa que a competência do Supremo Tribunal Federal em matéria Constitucional se limitava ao julgamento de recursos, veja-se:

Art. 59. Ao Supremo Tribunal Federal compete.
I – Processar e julgar originaria e privativamente:

a) o Presidente da República nos crimes communs e os Ministros de Estado nos casos do art. 52;

b) os ministros diplomaticos, nos crimes communs e nos de responsabilidade;

c) as causas e conflictos entre a União e os Estados, ou entre estes uns com os outros;

d) os litígios e as reclamações entre nações estrangeiras e a União ou os Estados;

e) os conflictos das juizes ou Tribunaes Federaes entre si, ou entre estes e os dos Estados, assim como os dos juizes e tribunaes de um Estado com os juizes e tribunaes de outro Estado.

II – Julgar, em gráo de recurso, as questões resolvidas pelos juizes o Tribunaes Federaes, assim como as de que tratam o presente artigo, § 1º, e o art. 60.

III – Rever os processos findos, nos termos do art. 81.

§ 1º Das sentenças das justiças dos Estados em última instancia haverá. recurso para o Supremo Tribunal Federal:

a) quando se questionar sobre a validade ou applicação de tratados e leis federaes, e a decisão do tribunal do Estado for contra ella;

b) quando se contestar a validade de leis ou de actos dos governos dos Estados em face da Constituição, ou das leis federaes, e a decisão do Tribunal do Estado considerar validos esses actos, ou essas leis impugnadas. (gn)

Observa-se, dessa forma, que na Constituição de 1891 o controle de constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal se revelava bem modesto, limitado o julgamento de recursos que se prestassem a contestar a validade de leis e atos do Poder executivo face a Constituição.

Somente em 1964, iniciou-se, ainda acanhada, introdução do modelo de controle abstrato de constitucionalidade, de inspiração germânica, assim representado:

Art. 114 – Compete ao Supremo Tribunal Federal:
(…)

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas, em única ou última instância, por outros Tribunais, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência a tratado ou lei federal;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato do Governo local, contestado em face da Constituição ou de lei federal;

d) dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.

Mas foi decididamente a Constituição da República de 1988 que estabeleceu a forma hoje vigente, representando o modelo híbrido de controle de Constitucionalidade, expresso no artigo 102, onde se depreende:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda 3da Constituição, cabendo-lhe:

I – processar e julgar, originariamente:

a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal:
(…)

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face destaConstituição.

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Em suma, há no ordenamento brasileiro tanto o modelo de controle difuso, pois, ao se deparar com uma norma que seja reputada inconstitucional, qualquer juiz poderá declarar a sua inconstitucionalidade; quanto o modelo de controle abstrato, nomeado que foi  o Supremo como “Guardião da Constituição”, único legitimado a exercer o controle concentrado de constitucionalidade, detendo a palavra final sobre a constitucionalidade das normas.

É como muito bem explica o mestre Ronaldo Brêtas Dias:

No Brasil, como sucede também em Portugal, as modalidades de efetivação da jurisdição constitucional ocorrem, simultaneamente, por meio do sistema misto complexo, na qualificação da doutrina portuguesa. Por meio da jurisdição difusa, o controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos é feito de forma concreta e incidental, por qualquer órgão jurisdicional, ou seja, a questão constitucional é conhecida e apreciada de ofício ou sob arguição das partes (exceção) em qualquer processo que estas iniciarem, mas tal controle limita-se ao caso específico em julgamento. 

Na jurisdição concentrada, o mesmo controle de constitucionalidade é atribuído exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, mediante provocação das pessoas legitimadas a tanto no texto constitucional, em processo próprio, cujo julgamento se insere no âmbito da competência originária daquele Tribunal, que a declara a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo sob apreciação em tese, de forma que seu pronunciamento final possa ter eficácia para todos. A coexistência tradicional, democrática e benfazeja desses dois modelos, no sistema constitucional brasileiro, permitindo o exercício da jurisdição constitucional, ao mesmo tempo, em sede difusa ou concentrada, conduz às seguintes afirmações conclusivas: 1ª)- no Brasil, a rigor, toda jurisdição é constitucional, apreciar e decidir as questões constitucionais suscitadas em qualquer processo, nos casos concretos levados à sua apreciação para julgamentos; 2ª)- a partir daí, órgãos da jurisdição constitucional.

Dessa forma, a união desses dois modelos de controle de constitucionalidade formata o sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, que pode ser reconhecido como um sistema híbrido (ou misto), uma vez que adota características desses dois modelos distintos de realização do controle da constitucionalidade das normas.

EFEITOS DAS DECISÕES DO STF EM CONTROLE DIFUSO E CONCENTRADO

Estabelecido que o Supremo Tribunal Federal pode exercer tanto o controle concentrado como o difuso, passa-se a análise dos efeitos das decisões proferidas em cada modelo, em cada forma de atuação da Suprema Corte, frente as hipóteses concretas.

Com relação ao controle concentrado, a Constituição da República estabelece no §1º do já mencionado artigo 102 que:

§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. (gn)

Evidencia-se, portanto, que no controle concentrado de constitucionalidade, o legislador constitucional já estabelece o efeito erga omnes das decisões proferidas pela Corte Suprema.

Nesta esteira, resta evidenciado que o inciso X do artigo 52 da CR apenas se aplica as decisões em controle difuso de constitucionalidade, conforme estabelecido pelo eminente professor Flávio Martins Alves Nunes Júnior:

(…) essa atuação do Senado na suspensão da execução de leis inconstitucionais é exclusiva do controle difuso de constitucionalidade, não se aplicando ao controle concentrado. Assim, se o Supremo Tribunal Federal declarar uma lei inconstitucional em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, não haverá remessa para o Senado, já que a própria decisão do STF produzirá efeito erga omnes e vinculante.

A doutrina é uníssona ao pontuar que:

Mesmo no âmbito de uma ADIn, o STF pode examinar incidentalmente e de ofício uma norma que não foi impugnada, mas que deveria ser aplicada para responder à demanda principal. Assim podemos ter uma declaração incidental de inconstitucionalidade no controle principal e abstrato.

Portanto, as decisões, tiradas em sede de controle difuso, teriam efeitos entre as partes e não vinculantes, por interpretação inversa do mencionado dispositivo constitucional, atrelado a interpretação sistêmica da Constituição, eis que o artigo 52 da Carta Magna em inciso X textualmente estabelece como competência exclusiva do Senado Federal: 

X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

Outro não é o entendimento da doutrina, nas palavras de Emanuel Ferreira:

O estudo do papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade ainda é relevante, tendo como ponto de partida o art. 52, X, da Constituição, o qual estabelece que é competência do Senado Federal: “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. ”

Um esclarecimento prévio necessário, no entanto, demonstra que tal atuação só tem razão de ser nos casos de declaração incidental de inconstitucionalidade por parte do STF. Em tais casos, a decisão do STF, classicamente, não possuía eficácia erga omnes, cabendo ao Senado, em acolhendo a decisão, atribuir tal eficácia ao julgado. Quando se trata de controle concentrado de constitucionalidade, a atuação do Senado não se faz necessária, pois, nesse caso, a própria Constituição prevê que a decisões definitivas de méritos proferidas pela Corte em sede de ADI ou ADC têm eficácia erga omnes e efeito vinculante. ”

Conclui-se, dessa forma, que na hipótese de controle difuso pelo Supremo Tribunal, as decisões possuem, como regra, efeitos restritos entre as partes e que na declaração incidental de inconstitucionalidade da lei, cabe ao Senado Federal, de forma privativa, a suspensão de sua execução.

E assim também caminhavam as decisões do Supremo, conforme se observa da conclusão do Ministro Luis Roberto Barroso:

A razão histórica – e técnica – da intervenção do Senado é singelamente identificável. No direito norte‐americano, de onde se transplantara o modelo de controle incidental e difuso, as decisões dos tribunais são vinculantes para os demais órgãos judiciais sujeitos à sua competência revisional. Isso é válido, inclusive, e especialmente, para os julgados da Suprema Corte. Desse modo, o juízo de inconstitucionalidade por ela formulado, embora relativo a um caso concreto, produz efeitos gerais. Não assim, porém, no caso brasileiro, onde a tradição romano‐ germânica vigorante não atribui eficácia vinculante às decisões judiciais, nem mesmo às do Supremo Tribunal. Desse modo, a outorga ao Senado Federal de competência para suspender a execução da lei inconstitucional teve por motivação atribuir eficácia geral, em face de todos, erga omnes, à decisão proferida no caso concreto, cujos efeitos se irradiam, ordinariamente, apenas em relação às partes do processo.

No próprio julgamento da ADI 3470/RJ, observe-se que o Min. Alexandre de Morais, propõe um esclarecimento no citado julgamento, assim se manifestando:

A questão de uma nova interpretação do artigo 52, X, não foi colocada nem como questão de ordem. Por que digo isso? Até hoje, o Supremo Tribunal Federal entende que, no controle difuso, o Senado Federal não está obrigado a estender os efeitos interpartes para erga omnes das declarações incidentais do Supremo. Isso são debates históricos e pode até vir – é sempre uma proposta do Ministro Gilmar -, mas até hoje o entendimento do Supremo Tribunal Federal em relação ao artigo 52, X, é que ao Supremo cabe declarar para o caso concreto e ao Senado cabe, se entender necessário, suspender, dando efeitos gerais. Aliás, a grande diferença do controle concentrado é que a suspensão dá efeito sempre ex nunc, não retroativos. Poderíamos até evoluir nesse sentido, mas eu quero dizer que eu não votei em relação a isso porque não era isso que estava em questão. Só para deixar claro.

Em 2007, no bojo do julgamento da Reclamação 4.355/AC, surge a tese da “mutação constitucional”, lançada pelos ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, que consistia em interpretar o texto constitucional “compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”, para que assim fosse lido “compete privativamente ao Senado Federal dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão definitiva do Supremo”.

Está aí o ponto central da questão e sempre que se ventila a tese da abstrativização do controle difuso de constitucionalidade, vem a reboque, a tese da ocorrência da mutação constitucional do artigo 52, X.

E, a partir do referido julgamento (ADI 3470/RJ), houve verdadeiro overruling pelo Supremo Tribunal Federal ao admitir efeito erga omnes em decisão incidental, fruto justamente da Teoria da abstrativização do controle difuso.

Tal teoria estabelece que, se o Plenário do STF decidir pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ainda que em controle difuso, essa decisão terá os mesmos efeitos do controle concentrado, ou seja, eficácia erga omnes e vinculante.

Para essa corrente, que acabou majoritária no julgamento da ADI 3470/RJ, o art. 52, X, da CF/88 sofreu uma mutação constitucional e, portanto, o papel do Senado, atualmente, seria apenas o de dar publicidade à decisão do STF.

Em outras palavras, a decisão do STF, mesmo em controle difuso, já seria dotadade efeitos erga omnes e o Senado apenas conferiria publicidade a isso.

Tal conclusão restou evidenciada no Voto da Min. Cármen Lúcia, que afirmou que o STF está caminhando para uma inovação da jurisprudência, no sentido de não ser mais declarado inconstitucional cada ato normativo, mas a própria matéria que nele se contém, veja-se:

E quanto à proposta apresentada, neste caso, pelo Ministro Gilmar Mendes, que foi objeto de considerações finais agora, em que pese não ser o objeto específico das ações diretas, diria que talvez, Ministro Celso, nós estejamos encaminhando, como disse, para um reconhecimento de que as matérias, sendo idênticas, sejam declaradas inconstitucionais, até porque nós falamos muito – doutrina e jurisprudência – em controle concentrado e controle difuso e em controle concreto e controle abstrato como se fossem sinônimos. Na verdade, o que é concentrada e a competência para o julgamento, e então se tem o controle abstrato, a lei em tese, no dizer que tivemos aqui.

É neste sentido a conclusão do Min. Edson Fachin, senão veja-se:

Na declaração incidental. E, portanto, à luz do parágrafo único do artigo 28 da Lei nº 9.868, somado com dispositivo do nosso Regimento Interno que consta do artigo 101, é possível depreender a direção daquilo que, num dos segmentos da intervenção do Ministro Gilmar Mendes, acabou emergindo. Ou seja, essa declaração de inconstitucionalidade não há como, para resolver eventual anomia e fragmentação da unidade, não há como não depreender a possibilidade, com todas as cautelas possíveis, disto se projetar para a compreensão das demais demandas, sob pena de nós efetivamente ficarmos numa metodologia semicircular progressiva, onde, pensando por problemas, não só criamos mais problemas e declaremos inconstitucional uma ideia legislativa que ainda não se materializou. O que nós temos é o presente, e esse presente é o artigo 2º da Lei nº 9.055, que foi declarado inconstitucional por maioria qualificada, tout court.

Entretanto, não há como ignorar-se que atribuir efeito erga omnes a toda declaração de inconstitucionalidade, retiraria do Senado Federal atribuição estabelecida pela Constituição da República, como se observa das palavras do Min. Marco Aurélio Mello, em seu voto:

Recuso-me a dizer que o Senado da República é um verdadeiro Diário Oficial, que simplesmente deve publicar as decisões do Supremo formalizadas no controle concreto de constitucionalidade, no âmbito do controle difuso de constitucionalidade. Não interpreto literalmente, gramaticalmente, o que se contém no inciso X do artigo 52 da Constituição Federal, mesmo porque a interpretação gramatical é a que mais seduz, é aquela a que se chega, ao objetivo da norma, numa visão superficial. Entendo o inciso X do artigo 52 como regra que atende a independência e harmonia entre os Poderes, a sinalizar que o sistema nacional é equilibrado, ao prever – e em bom vernáculo – competir ao Senado não simplesmente publicar a decisão tomada pelo Supremo, mas ao Plenário: (gn) 

Surge então, como definitiva e verdadeiramente delimitadora da matéria a posição do Min. Gilmar Mendes que estabelece ou resume a controvérsia:

(…) E, claro, também o efeito vinculante já vem acompanhado. Tanto é que temos aqui – e já discutimos isso no semestre passado – uma certa contradição. Por quê? Porque hoje misturamos situações da repercussão geral com o controle concentrado. E há coisas que estão na repercussão geral, inclusive as questões de ordem que encaminhamos, por exemplo: suspensão de processo, provimento ou não provimento automático e tudo mais, de recursos, e não aplicamos isso no controle abstrato, que já é dotado de efeito vinculante e eficácia erga omnes.

Também, dissemos, precisamos fazer esse acoplamento, não é?

Assim, parece-me que também é correta aquela expressão que Vossa Excelência usou, Presidente, de que, nesses casos, declaramos a inconstitucionalidade não apenas da norma, mas da matéria.

Há então um elemento distintivo, capaz de justificar o efeito erga omnes e a delegação ao Senado de restrita função de conferir publicidade à matéria já resolvida e consolidada, quando a inconstitucionalidade da norma for motivada e atingir a matéria a ela vinculada, distinguindo repercussão geral (com efeito erga omines) em sede de controle concreto, com controle concentrado.

Não por outra razão, o resultado final do julgamento restou assim publicado:

O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, julgou improcedente a ação, e, incidentalmente, declarou a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 9.055/95, com efeito vinculante e erga omnes. (200 a 201)

Conclui-se que a tese majoritária vigente no Supremo Tribunal Federal consiste em reconhecer ou empregar efeito vinculante e erga omnes às decisões postas em sede de controle difuso de constitucionalidade, com efeitos imediatos e sem a necessidade do Senado Federal editar ato suspendendo a edição da norma declarada inconstitucional, tal como ocorre no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade.

Há, entretanto, um limite a ser observado, tal como o fez o Min. Dias Toffoli:

É que aqui, a rigor, nós estamos no controle abstrato – em um caso concreto em controle abstrato, não no controle difuso -. Para analisar, em meu voto, a lei estadual, eu precisei declarar inconstitucional a lei federal. (164-201)

Então, o que se observa, extraindo-se das conclusões constantes do leading case em análise, em que primeiro se observou a mudança de entendimento pretoriano quanto os efeitos vinculantes do controle difuso de constitucionalidade, é que houve objetiva limitação. Isto porque no caso em exame, restou consignado que para análise do mérito da ação direta de inconstitucionalidade (ou constitucionalidade) realizada em sede de controle concentrado, houve necessidade de apreciação da constitucionalidade ou não de Lei Federal, realizada em sede de controle difuso.

Neste cenário, incabível aguardar-se que o Senado Federal, a luz de sua competência, suspendesse os efeitos da lei declarada incidentalmente inconstitucional, para só então, julgar o Supremo Tribunal, o mérito da ação direta de inconstitucionalidade.

Não se trata, portanto, da aplicação da Teoria da abstrativização do controle difuso, mas a aplicação, no caso concreto, de efeitos vinculantes e erga omnes necessários ao julgamento do mérito da ação direta.

Neste sentido, não se vislumbra uma posição generalizada do Supremo Tribunal Federal em igualar os efeitos das decisões em sede de controle concentrado de constitucionalidade com aquelas em sede de controle difuso, o que de fato, tornaria letra morta a competência estabelecida pelo artigo 52 da Constituição da República.

Deduz-se do reposicionamento do Supremo Tribunal Federal que é possível, nos casos em que, embora por controle difuso, a norma legal esteja sendo apreciada em abstrato, a aplicação dos mesmos efeitos empregados ao controle concentrado.

Conclui-se, portanto, permanecer hígida a regra de que os efeitos das decisões tiradas em controle difuso de constitucionalidade, ainda que pelo Supremo Tribunal Federal, apenas produzem efeitos entre as partes, necessitando de ato do Senado Federal para sua suspensão, na forma preconizada pelo artigo 52, X da Carta Magna, representando exceção o emprego de efeitos erga omnes ao acórdão do Supremo Tribunal que julgar, em concreto, a inconstitucionalidade de Lei Federal.